Postado em 26 de Agosto de 2018 às 15h06

Inspire-se com Emília dos Santos Muller: 88 anos de história e bom humor

Cleiton Fossá Chapecó – O trajeto é longo para chegar a casa da dona Emília Dos Santos Mueller. Do centro de Chapecó até a chácara da família é necessário percorrer...

Chapecó – O trajeto é longo para chegar a casa da dona Emília Dos Santos Mueller. Do centro de Chapecó até a chácara da família é necessário percorrer aproximadamente 25 quilômetros, cerca de 40 minutos de carro. E neste trajeto, muita estrada de chão e uma paisagem espetacular. Os raios de sol iluminavam a escuridão da rua através das árvores, que formavam um túnel. A frente das ramadas o cenário aberto. A plantação seca, tons de laranja e vermelho, entrava em harmonia com as cores frias do céu.

Entre as paisagens, que parecem surreais, é localizada a linha Barra da Chalana, interior de Chapecó. No portão do sítio estava a sobrinha da Emília, pronta para ir à casa da tia. O chão de terra batida, que deixava barro duro e avermelhado na sola dos sapatos por conta da chuva de outros dias, indicava o caminho da casa de madeira larga e ripas saltadas, que na parte baixa eram curvadas. As cores do lar, um reflexo da natureza. O tom abacate na parte maior da estrutura. O tom verde-claro nas janelas e portas.

A senhora baixinha, 1,50 de altura, sentou nas cadeiras colocadas na área antes das 15h, o horário da entrevista. De início, questionou: Estou pronta, mas não sei o que falar. O que vocês precisam. Em seguida, caiu na gargalhada e emendou o próprio questionamento. Vim morar aqui com o pai aos 14 anos. Só que era mais pra frente. "Iiiii", era feio de olhar. Puro mato, só tinha roça. Eles foram entrando e limpando o terreno. Quando viemos pra cá, era uma casinha assim, com tábua. Emília encostou a ponta dos dedos da mão direita com a esquerda para representar o teto da casa onde viveu com os pais, os cinco irmãos e quatro irmãs.

Desta época, Emília tem lembranças tristes. A família também morou em Flor do Sertão e nessa região assassinaram dois de seus irmãos. Emília explicou que a vizinhança era desconfiada e maldosa. Mataram de varde. Devido à perda dos filhos, a mãe de Emília entrou em depressão e adoeceu, por conta disto faleceu. Coitada da mãe, ela sofreu muito. Não tinha como entender, por que matar por nada. Não tem um dia que a gente esqueça, frisou Emília.

Além do sofrimento da perda, também as dificuldades. Na década de 1940, não havia energia e nem água encanada. Pra iluminar, a gente tinha um lampião de lata ou de vidro, tinha um buraquinho nele, daí só precisava por querosene pra acender. A geladeira nem existia. Pra guardar a carne, a gente fritava o porco e colocava tudo dentro de uma lata. A carne de gado, a gente cortava, colocava sal e deixava secar no sol. Hoje acostumamos com a luz, quando falta não é fácil, disse.

O acesso a água não era diferente. Para lavar as roupas era necessário percorrer cerca de três quilômetros. Tudo era feito no rio. Para dar água para a criação precisava colocar três barris em cima da carroça e fazer este procedimento três vezes ao dia. Inclusive, para tomar banho também era necessário usar a água do rio, Emília soou baixinho, hoje tá muito diferente.

O que a dona Emília sente mais falta daquele tempo, é o trabalho. Sinto saudade de carpir e plantar com máquina. As brincadeiras de criança estavam todas ligadas a lavoura e quando ia brincar de casinha, as filhinhas bonecas eram feitas com sabugo de milho ou de vários tecidos enrolados. Ela explica que o pai não tinha dinheiro para garantir os estudos. Então sempre se envolveu com as atividades da roça. Sinto falta porque agora já não posso fazer, salientou.

Conhecer a cara metade também não foi uma missão muito fácil, o pai da dona Emília sempre estava atento. Ele levava eu e minhas irmãs para o baile. A gente montava no cavalo para ir, mas o pai ia junto e sempre ficava de olho. Mas não conheci meu namorado no baile. Ele era meu vizinho, ressaltou. A filha e a sobrinha questionaram para Emília na roda de conversa, de que forma o namoro começou. Envergonhada, ela olhou na direção das árvores do terreno de sua casa e respondeu, Começamos porque precisa começar, né? Após cinco anos de namoro, Emília foi pedida em casamento. Meu pai ficava muito bravo, não sei como meu namorado teve coragem de pedir, concluiu.

A senhora de 88 anos de idade, guarda bem suas lembranças. Minha sobrinha diz que a minha memória é boa. Mas para garantir, quando eu guardo alguma coisa eu já aviso onde coloquei, salienta. Emília, roncou o mate, alcançou a cuia para a filha e em seguida já sorriu, Mas a minha história eu lembro bem, concluiu. As fotos registram os momentos especiais, mas o coração preserva cada acontecimento melhor do que qualquer porta-retratos. Eu sempre recebo visitas. O que mais me deixa contente é quando estou reunida com meus seis filhos e parentes. Nossa família sempre gostou de festas. Então a gente se reúne no salão da comunidade, dança, se diverte e o gaiteiro toca até as 18h30. O pessoal vem pra minha casa quando fecham o salão, daí terminamos a festa só a noite, destaca.

Emília Dos Santos Mueller, nascida dia 30 de junho de 1930. Ela torna todas as suas experiências, sejam elas ruins ou boas, em lição de vida. Mesmo com tanta bagagem, ela deixa claro. Para os mais novos só dou conselho se precisar muito. Não adianta, né? Como dizem, se conselho fosse bom, não era de graça. Porém, a expressão da sobrinha e da filha revelam, ouvir a dona Emília é uma satisfação. Além de tudo, a tia é benzedeira, se você machucar as costas e pedir para ela benzer, parece que costura. Esses dias eu não aguentava de dor no pescoço, vim na tia e melhorou, disse Alenira Mueller. Emília conta que aprendeu a benzer porque ela sempre levava as crianças em uma senhora que falava muito alto e, de tanto ouvir, ela decorou. Não sou profissional, mas a gente tem fé e isso já conta.

Na parte final da entrevista, Emília ainda conta uma piada sobre o seu tempo de vida, "Meu compadre disse, precisam aprender logo o benzimento da comadre, porque aquela ali, "iiiii", já tá véia. A alegria é garantia de que Emília tem muita vida pela frente. Eu gosto de viver aqui, a gente tem de tudo. E tudo que a gente passa é um aprendizado", conclui.

 

Alessandra Favretto, Assessoria de Comunicação Cleiton Fossá

Parabéns, Chapecó: 101 anos de história

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