"88 anos já é metade da vida", Osvaldo Maffissoni.
Nos dias frios de agosto não poupou fogão a lenha. Foi assim, com a cozinha quentinha, que Osvaldo Maffissoni contou sua história. E quanta história! Nascido quatro de maio de 1931, no município de Lajeado, onde cresceu na companhia de 14 irmãos, iniciou seu legado. O modo de vida típico de quem morou no interior em um tempo que não havia luz e água. "Nunca tivemos luz, o falecido pai carneava os porcos que criava. A carne precisava salgar, fritar e deixar numa lata. Não tinha geladeira", conta.
Nada era prático, a cama era pregada com tábuas e os colchões feitos de palha. Três pessoas dormiam juntas. Osvaldo explica que para fazer as roupas o seu pai, Luis Fernando Maffissoni, comprava tecidos em metros para que a sua mãe, Judith Pozzebom, pudesse criar as peças. Todos os irmãos andavam iguais. "A mãe remendava as calças rasgadas, hoje em dia acham até bonito", expressa.
Para tomar banho era utilizada a água das vertentes. Osvaldo, extremamente bem-humorado, brinca, "Naquele tempo tomava banho de vez em quando. Agora tô me cobrando daquele tempo, tomo banho que a água chega a fazer fumaça". Já os banheiros nem existiam, nem sequer as patentes, a alternativa era ir para o mato e debulhar as espigas.
Osvaldo teve oportunidade de estudar até a quarta série. Com os materiais numa sacola de pano, caminhava três quilômetros para chegar à escola. O percurso era realizado sem calçados. Para aprender utilizava uma pedra, a professora fazia a correção e apagava o conteúdo todos os dias para que fosse reutilizada. Entretanto, precisou parar de frequentar a escola para trabalhar e pagar os estudos do irmão, que se formou padre.
Nesse período, cuidou dos outros irmãos. "Obedeciam até", frisa. Foi assim que nos dias necessários tornou-se o cozinheiro da casa. O método de preparo era diferente do qual fomos acostumados. Nada de fogão elétrico. A lenha era queimada no chão de terra da cozinha, era pendurada a panela na corrente e o procedimento era realizado para cada alimento preparado, uma panela por vez.
Após cultivar muita terra na região, no tempo conhecida como Vila Progresso, Osvaldo, aos 17 anos, mudou-se junto à família para Coronel Freitas. Quando passou pela primeira vez em Chapecó, para fazer o alistamento, a igreja havia sido queimada, estava toda destruída. Osvaldo lembra que começaram a prender e matar pessoas. Prenderam cerca de 80 pessoas no moinho. Um período triste da história do município. No tempo a avenida era toda de cascalho, não havia prédios, apenas casas de madeira e muitos pinheiros. O transporte era muito difícil. Inclusive, Osvaldo e seu colega perderam o ônibus que retornava para Coronel. Recorda que o motorista morava por perto e, na volta pra casa, deixou eles na metade do trajeto, o restante foi trilhado a pé.
O início do romance de Osvaldo foi resultado de uma matinê. Foi em uma festa onde conheceu Tereza. Osvaldo tinha 19 anos. Para encontrá-la precisava caminhar sete quilômetros e atravessar o rio de barca. No trajeto da volta até cobra encontrou, "se ela pega engole em uma pessoa". Tereza e Osvaldo namoraram durante três anos e meio. Por conseguinte casaram e moraram na casa do sr. Luis. "No início foi difícil até os primeiros beijos, a gente não era acostumado", conta.
A primeira casa, onde morou dois anos e meio com Tereza, foi trocada por uma serraria. Osvaldo conta que os bois eram preparados, obedeciam apenas conversando. Negociou a serraria com três sócios e ganhou um terreno. Na época também comprou um caminhão, F600, num campo de futebol, um amigo ensinou Osvaldo a dirigir. "Estourou a borracha do freio, mas meu amigo não me deixou voltar pra casa, só porque era a primeira vez que eu dirigia", conta.
Entre tantas negociações, Osvaldo comprou uma casa de dois andares em Cairu. Neste espaço administrou um hotel, uma bodega e uma delegacia. Foi prefeito e promovido a delegado, contratou um policial para trabalhar com ele. Após vender os seus empreendimentos Osvaldo, veio morar em Chapecó. A cidade estava desenvolvendo, já tinha calçamento, a Néri no tempo trabalhava em uma combi, o Zolet abriu uma loja, tinha a Loja Marafom e estavam construindo a escola.
"Chapecó tinha 31 anos quando começou a virar cidade. Começaram a construir prédios, o primeiro se não me engano foi o Zandavalli, depois construíram o mais alto que era o Borsatto. Daí começou frigorífico, o Celeiro era numa casinha de madeira, o primeiro Brasão foi perto do terminal e tinha o hospital Santo Antonio, onde é a Unimed. Acompanhei de tudo. O primeiro acidente de avião foi no aeroporto quando era aqui no São Cristóvão, fui ver e foi triste dava pra enxergar as pessoas queimadas", conta.
Em Chapecó Osvaldo abriu uma serraria elétrica e outra, ainda sem eletricidade, em Guatambu. Porém, vendeu tudo o que tinha, mas conta que se endividou e teve de começar do zero. Comprou um fusca amarelo e começou a vender roupas. Osvaldo casou-se com Marelice Scussiato, em 1995 teve mais uma filha e então foram morar em Góias, onde ficou por três anos e retornou para Chapecó. Sua esposa faleceu em 2003. Hoje carinhosamente é chamado pela filha de "pãe", já que Osvaldo foi mãe e pai para ela.
Osvaldo mora 11 anos no bairro São Cristóvão. Recentemente teve problemas de saúde. O médico comentou para a família que Osvaldo poderia perder a memória, mas longe disso, ainda no hospital lembrou a filha de fazer os jogos de loteria, disse que os números estavam embaixo de uma camisa no guarda-roupa. Sem implicações, contou cada detalhe de sua história. Osvaldo deixou bem claro que tem muita coisa pra viver: "88 anos já é metade da vida", conclui.
Alessandra Favretto,
Jornalista- MTB 06503/SC
Foto: arquivo pessoal.
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